01 fevereiro 2017

Terreiro de Mãe Corina sofre com perseguição religiosa e abusos da Guarda Municipal de Diadema



 Imagine o quão violento é para uma sacerdotisa de quase 90 anos ter seu terreiro interrompido por quem deveria proteger seu direito de fé. 

Um dos templos de umbanda mais antigo de Diadema, o Terreiro Vó Maria de Aruanda, fundado e conduzido por Mãe Corina, tem vivido dias assustadores desde o último 14 de janeiro, quando a festividade foi interrompida pela guarda municipal que ao invadir o terreiro ordenou que fossem encerrada a cerimônia, por volta das 21h. A rua foi tomada por viaturas que adentraram o pequeno terreiro, na região central da cidade, alegando que o templo infringia a , popularmente conhecida, lei do psiu.
"Eles não deixaram a gente tocar, anotaram todos as placas de carros para dar multa. Falaram que a gente estava tocando acima do decibéis e que a houve denúncias". Explicou Dani Amorim, filha de santo da casa que completou: "Minha avó tomou um grande susto, porque a gente estava no meio da festa, os orixás 'em terra', e as pessoas tiveram que sair correndo..."

Há mais de 60 anos, Mãe Corina mantém suas portas abertas para a prática da umbanda sagrada. Conhecida e respeitada por toda comunidade do entorno e pelas centenas de terreiros de Diadema, aos 86 anos de idade, a mãe de santo se assustou com a forma violenta e arbitrária com que a guarda municipal exigia o silenciamento de seus atabaques. Recentemente, ela atravessou um grave problema de saúde, ficando impossibilitada de andar por quase um ano, a melhora aconteceu graças à Iemanjá, seu orixá e aos guias de luz do terreiro.

"Eu também estou com medo porque ontem (30/01) nós estávamos decorando o terreiro, em silêncio, em respeito aos orixás. A gente vai fazer a festa de Iemanjá em agradecimento a saúde da minha avó. Minha avó ficou um ano sem andar, e hoje ela já está andando e 'trabalhando' com o caboclo dela, mas ontem parou GCM na frente da nossa casa de santo, e ficaram anotando um monte de coisas. Eu me senti ameaçada, porque eu precisava ir embora por volta da meia noite e dá medo de sair na rua de branco". contou Dani Amorim



Em tom de ameaça, os guardas municipais são enfáticos ao dizerem que o problema é com o barulho dos tambores do Terreiro de Vó Maria de Aruanda e qualquer que seja o horário, se os tambores tocarem e a vizinhança acionar a GCM, o culto será interrompido, o que explicita que a atuação do município é descaradamente intolerância religiosa, uma vez que não há sequer relato de outros seguimentos terem suas práticas interrompidas por, por exemplo utilizarem microfones e aparelhos de som durante seus ritos de pregação e cantos de louvores.

Ao saber do ocorrido, membros de diversos movimentos pró-direitos de fé dos povos de terreiros se colocaram indignados e prontos para a luta contra os abusos intolerantes protagonizados pela segurança pública da cidade, Cássio Ribeiro, presidente da FUCABRAD - Federação de Umbanda e Cultos Afro-Brasileiros de Diadema, publicou nota em seu perfil das redes sociais e questionou: "Até quando uma senhora tão cheia de amor,  ternura e de fé, será constrangida  e perseguida? A GCM faria isso em um culto evangélico? Colaria um pastor sob a mira de armas?"

Josa Queiroz, membro da FUCABRAD e vereador em Diadema, convocou o comando da GCM de Diadema para uma audiência pública a fim de propor um dialogo entre a prefeitura e o povo de terreiro da cidade para que sejam respeitados e não tenha o direito de expressão de fé cerceado pelo município. O ato acontecerá na próxima terça-feira, 07/02 às 17h, na Câmara Municipal de Diadema. 
 Link do evento: https://www.facebook.com/events/676336082569509/

É de extrema importância que a prefeitura de município se coloque diante do ocorrido e garanta o exercício de fé da comunidade vitimada pela intolerância institucionalizada. Diadema é uma cidade de tradição, conhecida nacionalmente pela sua atuação no enfrentamento a intolerância religiosa, onde o saudoso Toy Francelino de Xapanã protagonizou e impulsionou grandes feitos pelos direitos dos povos de terreiro, tornando-se referência na luta.

A atuação da GCM revela Diadema como uma cidade intoleranteque regride a tempos de silenciamento e marginalização das práticas religiosas afro-brasileiras. Uma cidade que ao invés de proteger, permite que sua guarda municipal agrida a moral de uma sacerdotisa de quase 90 anos de idade e que há 60 atende a comunidade com cuidados religiosos e ações comunitárias como entrega de alimentos, entre outras. É inadmissível que a quarta cidade mais negra do país não respeite a herança africana em sua terra, e não consiga aprender com griots como Mãe Corina a importância de se respeitar as diferenças e garantir a boa convivência em sociedade. 

Texto e Fotos: Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved


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