” Carta de Mãe Beata de Iyemonjá às autoridades sobre o uso da palavra ACARAJÉ pela Polícia Federal para denominar a operação contra a corrupção e por corruptos para designar dinheiro.
ACARAJÉ PÃO QUE ALIMENTA
Eu Beatriz Moreira Costa, Mãe Beata de Iemanjá é com pesar que vejo dia a dia como a questão cultural no Brasil está piorando.
Que País é esse Olorum? A que ponto chegamos? Dar o nome do saboroso e sagrado ACARAJÉ a uma ação policial contra as falcatruas e ladroeiras promovida por elementos vis e perversos que não merecem ser comparados à palha que tiramos do feijão para fazer o acarajé, quanto mais ao ACARAJÉ.
Vou traduzir para vocês em yoruba: akara quer dizer pão e unjé quer dizer o que se come. Acarajé pão que alimenta. Acarajé para os nossos ancestrais é um alimento sagrado que se oferece aos Deuses da natureza em momento de celebração. Não existe Orixá que não se sinta feliz em receber um acarajé. Para os Orixás que comem azeite de dendê, ele é feito com o mesmo. Para Obatala e os Orixás fun fun ele é feito com banha de ori, óleo de milho, girassol ou outro óleo qualquer. Não é para estar metido em roubalheira falta de caráter e falta de ética.
Eu, neste momento, como baiana e descendente dos meus ancestrais que foram capturados no solo sagrado da África, onde a história da humanidade começou, fico triste em ver um patrimônio de nossa cultura incluída nessa vergonheira. Infelizmente, as leis estão aí, mas não são cumpridas. E vou até dizer uma coisa, esses ladrões são dignos de compaixão, não sabem o que falam, o que é cultura, o que é saúde, o que é humanidade. Até aí se vê o grau de insensatez que chegou os dirigentes de nossa Nação.
Xangô, deus da justiça, Iansã deusa das tempestades, raios e vulcões que com seus elementos sagrados cubram toda essa perfídia.
O ACARAJÉ faz parte da nossa cultura, da nossa cidadania, é a nossa pertença.
Eu fui criada com muitas senhoras iyalorixas dignas e honradas no Recôncavo baiano que viviam do acarajé. Quem não conheceu em frente à Igreja da Purificação em Santo Amaro, Tia Encarnação que vendeu anos e anos o seu delicioso acarajé? Outras e outras mulheres negras faziam o mesmo em Cachoeira, no Acupe e em São Felix. A ladeira da Praça da Bahia, sempre decorada com as baianas vendendo os seus deliciosos acarajés. Ninguém era ladrão.
Em nome de Olorum, Senhora Presidente, a Senhora que é uma mulher que tanta esperança colocou na minha ideologia de negra descendente de africanos escravizados, assim como o Senhor ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, desejo que o acarajé lhe dê força, sirva de ferramenta política para que a Senhora e outras estadistas de moral, caráter e vergonha respeitem os nossos ancestrais. A razão do pendão de nossa esperança chamado o Brasil.
Nesse momento tenho tristeza de dizer que sou uma brasileira. Não temo a morte e não voto para compartilhar com ladrões, ignorantes e sem cultura.
ACARAJÉ quer dizer cultura. Quem não gostar, quem não aceitar o meu protesto, eu tenho nome e sobrenome. Sou Beatriz Moreira Costa, iniciada na religião do candomblé. Sou baiana do Recôncavo, nasci no Iguape, no Engenho Novo, descendente de africanos escravizados. Ninguém põe cadeado na minha boca e nem corrente nas minhas pernas.
Vamos Tia Ciata, Anastácia, Clementina de Jesus, Sinhá Dionísia, Iyalorixa Olga Francisca Regis, Dona Senhora, Obabiy e todas as iyalorixas e babalorixas do Rio de Janeiro e de todo o Brasil, vamos gritar pelos nossos direitos. A lei existe só falta que enfrente esse desrespeito com verdade, respeito, amor e esperança. Nossa Nação merece a nossa luta. Vamos a ela.
Odide Orixás, odide todos os meus ancestrais, Mandela, Gandhi, Fela Kuti.
Acorda Senador Paulo Paim, Deputada Benedita da Silva, Ex-presidente do Supremo Joaquim Barbosa, é a nossa cultura que está sendo desrespeitada é a nossa pertença.
Nesse momento eu peço socorro até a ONU e o Brasil ao Ministério de Cultura.
Rio de janeiro, 29 de fevereiro de 2016.
Beatriz Moreira Costa
Mãe Beata de Iemanjá