24 outubro 2020

Religiosos comemoram lei que homenageia tradições de matrizes africanas

 

Um passo contra a intolerância religiosa foi dado em Natal, somando-se às conquistas de povos de terreiros. O Dia Municipal das Tradições de Matrizes Africanas e Nações de Candomblé, 30 de setembro, foi aprovado na Câmara Municipal de Natal. A Lei n° 205/2018 é resultado de uma articulação do coletivo Gama – Articulação de Matriz Africana e Ameríndia do RN junto ao poder público.

O projeto foi apresentado pela ex-vereadora Natália Bonavides (PT) e subscrito por Divaneide Basílio (PT). A data será comemorada em acordo com a celebração nacional de mesmo dia. Em Natal estará alinhada à Lei federal n° 10.639/2003, referente ao ensino da cultura afro-brasileira nas escolas.

O Dia Municipal das Tradições de Matrizes Africanas e Nações de Candomblé reforça ações pedagógicas e sugere atividades e estudos sobre as tradições das religiões de raízes africanas, fortalecendo o combate à discriminação e de aceitação e valorização da cultura afrodescendente.

“É importante porque a cultura dos povos de matrizes africanas não pode ser apagada. Muitas vezes na escola as crianças não têm acesso a essa história. A maioria das vezes na mídia também não tem. A gente vê uma série de preconceitos”, destaca a vereadora Divaneide.

A Iyalaxé Flaviana d’Oxum, do terreiro Ilê Axé Dajô Obá Ogodô, em Extremoz, ressalta que a data não é uma conquista isolada. Os povos de terreiros têm se organizado socialmente ao longo dos últimos 15 anos e têm como uma das principais bandeiras o fortalecimento dos espaços no interior do estado.
“Natal sempre serve de base para o resto do estado. A conquista dessa lei faz parte dessa construção”, diz Flaviana, ao lembrar que os movimentos conseguiram registrar Estatuto da União de Umbanda do RN, além da realização de sessões solenes no 30 de setembro de 2019.

Intolerância
Flaviana d’Oxum salienta que a medida é importante para todas as religiões afro-ameríndias, como Umbanda, Candomblé e Jurema (genuinamente nordestina), principalmente porque em Natal ainda há muita intolerância religiosa e que esse preconceito está associado ao racismo. Ela destaca ainda que o maior símbolo dessa violência na capital potiguar é a depredação da imagem de Iemanjá, na Praia do Meio.
“A estátua simboliza a nossa liberdade religiosa. Aquele espaço de culto público foi conquistado pelos umbandistas da cidade, que foram os primeiros povos ligados às religiões afro-brasileiras que se empoderaram com voz ativa, defendendo esse direito”, lembrou a Flaviana, destacando que esse grupo articulado politicamente criou a União Espírita de Umbanda Do RN, que se transformou na atual Federação Espírita de Umbanda e Candomblé do RN (FEUC).
A própria Flaviana, que é de Candomblé e Jurema, conta ter sofrido diversos tipos de intolerância. “Por familiares, ao pegar um ônibus vestindo minhas indumentárias religiosas, no mercado ao comprar itens para oferendas, ao deixar minha filha na escola, ataques ao meu terreiro”, relata.
Casos de violência religiosa podem ser denunciados pelo Disque 100. O número de telefone do governo, criado em 2011, funciona 24 horas por dia para receber denúncias de violações de direitos humanos.

Entre 2015 e o primeiro semestre de 2019, foram quase 3 mil casos de intolerância religiosa – uma média de 50 por mês em todo o Brasil. Só em2019 foram reportados 411 episódios de discriminação religiosa.